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Pedro Fagundes de Borba

Autor: Pedro Fagundes de Borba

Natal no homem

22/12/2019 - Ribeirão Preto - SP

     Depois de Papai Noel e Jesus Cristo, Ebenezer Scrooge, protagonista do livro de Charles Dickens "Um conto de natal", é a figura natalina mais reconhecida. Seu ser, suas características e composições formariam, inicialmente, uma das mais repulsivas formas do capitalista do século XIX, formado após as revoluções francesa e industrial. Agindo como homem de negócios, tem a busca pela riqueza como forma de vida, forma de escapar da pobreza, aquilo que mais lhe atormenta, deixou isto claro no passado. Ainda que não se equivoque em tal busca, sua forma de ser, uma visão talvez moralista, passa longe demais em perceber que é parte de um mundo, podendo intervir nele, sem necessidade do voto de pobreza; parte importante do natal, a ideia cristã que é sua base. Ainda que o personagem careça de maior complexidade literária e de nuanças, é interessante para pensar como as pessoas podem agir no mundo. E o quão parecidas são elas a ele, característica marcante dos personagens de bons Best-sellers. 

   Após ter passado muitas noites de natal, se preparava para passar mais uma passagem, sozinho, economizando o que pudesse, comendo seu mingau. É quando recebe a visita, o fantasma do seu sócio Marley vem visitá-lo, carregando suas correntes forjadas na vida que levou. Anunciava que vinha salvá-lo do destino que tivera, ele que levara a vida da mesma maneira, seria assombrado por três espíritos. 

   No passado, tinha ficado muito tempo no colégio interno onde estudara, mesmo na época de natal. Em um deles, entretanto, sua irmã viera anunciar que podia voltar a ficar em casa, o pai deles havia se tornado homem mais gentil. Também lhe mostra a época de empregado do Sr.Fezziwig homem generoso e bonachão, que tinha sua loja. Finalmente, vê quando foi deixado por Belle, que percebeu ter ele outro ídolo, o de ouro, tomado o coração de Scrooge. Por último vê, ocorrido na época em que seu sócio estava morrendo, talvez já tivesse, viu o homem com quem se casara e tivera filhos, contar que passou pelo escritório de Ebenezer Scrooge. A vela estava acesa, ainda não havia fechado, não pode deixar de entrar. 

  Depois de apagar o espírito em forma de vela, o do passado, que se espalhou como poeira pelo chão, acabou voltando para o quarto. Seguindo a luz na sala ao lado, encontrou o espírito do natal presente. Mostrou como atua sobre a vida de pessoas, mostrando primeiro a ceia de Bob Cratchit, o único empregado de Scrooge, com sua esposa e filhos. O mais notável era Tim Cratchit, menino bondoso e manco, que corria o risco de morrer. Contra a vontade da esposa, Bob brinda a saúde do patrão, fazendo os outros presentes fazerem o mesmo. Mostrou o natal do sobrinho, que o havia convidado, onde brincaram e comentaram sobre Ebenezer, o sobrinho também brindando ao tio. Os que mais reconheciam a presença do espírito, entre os que ele mostrou para Ebenezer, os marinheiros. Quando estava para morrer, sua vida e de seus mais de mil e oitocentos irmãos é muito curta, o espírito deixou sair debaixo de sua túnica os filhos do homem, notou Scrooge. O menino chamado ignorância, a menina necessidade. Após uma dolorosa ironia, o espírito desapareceu. 

   O último, do futuro, veio mostrá-lo. Viram primeiro os homens em frente à bolsa de valores. Comentavam sobre um falecido. Brincavam, riam; se perguntavam para quem teria deixado o dinheiro. Para mim não foi, comentou um deles. Outro perguntou se algum estaria disposto a ir ao enterro. Se derem comida de graça sim, replicou aquele. Ebenezer Scrooge e o espírito continuaram vagando pela Londres do natal futuro, onde havia este morto. Viram a Sra. Dilber, e outros miseráveis, levar objetos de penhor para o velho Joe. Ela, Dilber, foi a que teve o pacote mais valioso a entregar: cortina de cama e cobertas. Não havia ninguém velando o morto, ela entrou e pegou. Alguns, já em outro lugar, que lhe tinham dívidas, se sentiam aliviados por verem-se livres, ou pelo menos aliviados. Scrooge precisou ver a ternura relacionada com a morte, ou se sentiria assombrado para sempre. Viu então a morte de Tim, filho de Bob. Quando perguntou ao espírito do natal futuro quem era o morto de quem se falava, foram para o cemitério com a lápide onde estava seu nome, Ebenezer Scrooge; desesperado, perguntou, sem receber resposta, se aquele era um futuro que ia acontecer ou que poderia acontecer. 

   Aos poucos, o fantasma parecia que se transformava na coluna da cama. Era mesmo. As cortinas estavam lá. Era natal. Tudo ocorrera numa noite, ele não perdera o dia do nascimento de Cristo. Estava feliz, como não se sentia há muito tempo, se assim já se sentira. Mandou um garoto que passava na rua comprar um enorme peru e o enviou a Bob Cratchit, evitar a ceia de natal pobre que havia visto. Aceitando o convite que o sobrinho Fred havia lhe feito para ceiar em sua casa, horrivelmente recusado no dia anterior, se perguntando se seria aceito após aquilo. Foi noite ótima. No dia seguinte, após assustar Cratchit fingindo continuar sendo o mesmo, lhe disse que lhe daria um aumento de salário. Depois de pensar chamar alguém para meter Scrooge em camisa de força, este agiu de modo sincero o bastante para entender a mudança real ocorrida. Mandou-lhe comprar carvão. Prometeu ajudar a família dele. Fez as promessas e muito mais. E para Tim, que não morreu, tornou-se quase um segundo pai. Tornou-se bom chefe, bom amigo, bom homem. Alguns riram. Deixou. Rir é tão bom. Não mais encontrou os espíritos, mas passou a ser este homem, transbordando de generosidade total. Todos concordavam que sabia como celebrar o natal. E, como Tim dizia: que Deus abeçoe cada um de nós.

   O natal entrou nele, através dos três espíritos. Considerando como alguém que está em parte importante do capitalismo, poderia ter outra postura pessoal, o que, enquanto indivíduo, pode fazer diferença em alguns momentos, isto ocorreu pela ideia central em torno do natal, relacionada principalmente com a bondade e ao senso de comunidade, evitando o domínio do egoísmo e da simples indiferença para outros setores da sociedade. Ebenezer Scrooge mesmo, fora bom em natais passados, se apegando demais ao dinheiro. O presente ocorria com ele sendo daquela forma. E podia ser apenas aquilo no futuro. Sentindo forças natalinas dos espíritos, percebeu novamente porque é que muitos cidadãos agiam daquela maneira, o motivo real da festa, tantas vezes relanceado, não reverenciado. Tornou-se também alguém capaz de perceber isto, fazendo e tornando-se o melhor. Se Ebenezer Scrooge e o livro "Um conto de natal" não são nem história nem personagens tão humanizados, refletem partes importantes do eu, sobretudo maneiras de enxergar o mundo, a sociedade e como agir. Se não é solução de problemas, pelo menos os torna mais claros, se tem alguma vontade de que estes desapareçam. 

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