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Pedro Fagundes de Borba

Autor: Pedro Fagundes de Borba

Enfeitiçado

13/12/2020 - Ribeirão Preto - SP

    Enfeitiçar pessoas se mostra decisivo para resolução dos casos, para o cumprimento dos destinos. Usando as extraordinárias forças existentes, derivadas do desconhecido, do real e do complexo, permite que a situação, já desenhada, se cumpra, ocorra desta maneira.  Os feiticeiros, magos e bruxos, bem como as feiticeiras, magas e bruxas, serviram de personagens, ideias e representações para inúmeras histórias, servindo tanto como gênero particular de narrativa como aprofundamento da literatura erudita. Atingiram também o Brasil e suas características. Um grande feiticeiro mineiro, João Guimarães Rosa, retratou estes e suas visões em várias de suas narrativas, em suas várias formas, com as feitiçarias da literatura.

   No conto de Sagarana, “Corpo fechado”, narra a história de um médico que acompanha o valentão Manuel Fulô, que se envolvera em várias brigas e desentendimentos, valorizava muito sua mula Beija Fulô, para a qual quer pôr uma sela mexicana. Fala sobre histórias com outros valentões, suas formas e suas ações, como eram, entre eles José Boi, brigando com dois cabos e um soldado, e Adejalma que brigava em bodegas. Conta quando passou tempo com os ciganos, para aprender truques sobre cavalos, como não deixar os dentes aparecer, truques vários para vender cavalo velho sem que percebessem. Depois voltara para o arraial de Laginha, onde a história acontece.

   Sobre outros valentões, há um pelo qual nutre ódio particular, com mais força, que é Targino, que, em sexta feira de paixão, reunia amigos igualmente ruins para comer carne e tomar cachaça na frente da igreja. Após tomar cerveja com o médico narrador, vai puxar briga com Targino, este aparece no lugar onde bebiam, acaba levando tiro, e o outro anuncia que antes do casamento, passaria a noite com a noiva de Manuel, deixando ela para ele depois. Manuel ferido marca duelo para o dia seguinte, com o ódio elevadíssimo, levado pelo médico.

     Enquanto ainda conversavam, Manuel contou sobre Antoninho das águas, o feiticeiro local, alguém por qual Manuel também sente raiva, por querer sua mula Beija Fulô, enquanto Manuel lhe quer a sela mexicana. Diz para o médico que Antoninho lhe queria desvalorizar o trabalho de doutor, dominando a região. No dia seguinte, perto da hora, Antoninho aparece na casa do médico e de Manuel, querendo falar com ele em particular. Depois, durante o duelo, Manuel ataca Targino apenas com uma faca, parecendo um canivete, matando-o assim mesmo. Antoninho lhe havia fechado o corpo para a luta. Fica com a mula, e Manuel se casa com a amada. De vez em quando, Manuel Fulô podia andar pela região com a Beija Fulô, sendo o novo valentão.

      Antoninho assume nesta história o elo decisivo para seu desfecho, o que intervém com as forças necessárias para que aquela situação se desenrole, baseado muito no que se escreveu através da situação e do temperamento dos personagens, pois conseguia ler e entender estes momentos. Assim, fechou Manuel Fulô para que as forças tomassem suas formas, cumprindo sua parte no destino. Com tudo isto, Guimarães Rosa mostra de fato uma Sagarana da vida, um momento de feitiçaria decisiva, como esta se apresenta, com seu feiticeiro, expondo aspectos mais ocultos das situações. Mostra um tipo de momento, com figuras que geram amplas ideias, e ampla literatura, por causa disto.

   

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