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Pedro Fagundes de Borba

Autor: Pedro Fagundes de Borba

O poder instável

22/8/2021 - Ribeirão Preto - SP

           A recente tomada de poder no Afeganistão pelo grupo Talibã, que já havia governado o país, demonstra mais uma vez, entre outras coisas, a instabilidade política local e a dificuldade de se manter um governo. O local, que fica no final do Oriente Médio, próximo ao Extremo Oriente, é caracterizado como um dos espaços mais difíceis do mundo para se estabilizar e manter um governo. Até hoje, praticamente não houve democracia na região, muitas vezes mal havendo um governo mais centralizado.  

           O país tem também o apelido de cemitério de impérios, por ser um lugar muito difícil de manter um governo, sempre resultando em sua queda, destruição e guerras. Uma série de povos já tentou ocupar o lugar e manter um governo, falhando ou tendo dificuldade para manter. O Afeganistão, como país, se forma no início do século XX. Seu nome significa terra dos afegãos, o povo que ali se entendia. Na década de 1920, a jovem União Soviética é um dos primeiros países a reconhecê-lo. O país era então monarquia. Desde então, ainda é, o país é muito pobre, com grande desigualdade social e tendo principalmente ópio como principal produto econômico.

           Na final da década de 1970, entretanto, a instabilidade política volta a aparecer, principalmente por causa do crescimento de grupos extremistas islâmicos, que, em parte inspirados pela revolução islâmica iraniana ocorrida na época, começaram com os soviéticos, que tentavam impedir o mesmo de ocorrer em terras afegãs. A monarquia cai e o país mergulha, desde então, em constante guerra, passando por vários governos, de várias formas e orientações. A guerra se estendeu durante toda a década de 1980, entre soviéticos e mujahadeens, que depois se tornariam o Talibã. Ainda assolado pelo anticomunismo e guerra fria, EUA financia mujahadeens para conter o avanço soviético para mais regiões da Ásia.  

         Com o fim da guerra, os grupos extremistas continuaram atuando na região, mantendo intensa guerra civil pelo poder do país. Em 1996, assume o poder o Talibã, que surgira entre as várias dissidências entre os grupos extremistas iniciados pelos Mujahadeens. Após os atentados de 11 de setembro, sabendo que Osama Bin Laden era apoiado pelos talibãs, iniciou-se a intervenção americana no país em outubro do mesmo ano. Foi o mais longo envolvimento do país em uma guerra. Conseguiram, em pouco tempo, tirar o talibã do poder, mas permaneceram por 20 anos.  

         A saída das tropas agora em 2021 não demonstra derrota dos EUA na situação, e sim uma retirada, alteração da estratégia no contexto. Assim que houve esta saída, o talibã cercou e tomou a capital Cabul tomando o poder novamente. Volta a assumir as leis ultrarradicais e repressoras, que já foram bastante vistas. O antigo presidente do país, de viés mais laico, fugiu para o Tajiquistão quando percebeu que seria derrotado. Encontra-se agora a mercê de fundamentalistas, que já adotaram retrocessos brutais de leis, destacando a proibição do estudo para mulheres e as mesmas de andar desacompanhadas. Por tal situação, muitos afegãos tentaram fugir do país, como mostrado nos vídeos e imagens horrendas de pessoas circulando ao redor dos aviões na pista, subindo em cima deles, apenas para cair na decolagem e tentando embarcar de qualquer forma. 

        Tendo conseguido tirar o grupo do poder pouco após entrar no país, os EUA, mesmo ficando vinte anos, não fizeram com que este desaparecesse, ou fosse desmantelado. As explicações para isto são ainda bastante desconhecidas, pela questão de ser algo recente. Pode ser que não ter isso interessante para si esta derrota ou ser mais forte o grupo e com mais apelo popular também, tendo recrutado mais árabes durante este tempo, possivelmente. Pelas características da região, o nome cemitério de impérios continua fazendo sentido, tendo visto a grande quantidade de povos, governos e conflitos ocorridos ali, sendo sempre um espaço difícil de estabilizar, visto agora na duração das guerras no país.

    Não consegue manter estabilidade governamental, favorecendo e ajudando grupos fundamentalistas. Mas estes, assim como soviéticos, americanos e até ingleses no século XIX tentaram manter e ocupar a região, mas não conseguindo. Sempre caem governos e impérios na região. Sempre que algo assume não consegue se mantiver, cai. A monarquia que sucedeu à formação do país, que teve, em certos momentos, pretensões laicas, durou poucas décadas. Algo faz a região instável. Espero que não seja diferente com o talibã. Amém.  

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